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terça-feira, 19 de julho de 2011

DEVER, PODER E QUERER - Parte 12

            É certo que a salvação do poder do pecado se desenvolve por graça, pela manifestação da vida de Cristo em nós, conforme já comentamos em outra oportunidade. Assim, nosso querer, embora regenerados, está sujeito à ação da graça divina. HORATIUS BONAR, em interessante artigo intitulado "A vontade de Deus e a vontade do homem" comenta que depois de regenerada, a vontade do homem ainda é uma seguidora, e não um guia. Muitas vezes relutamos em fazer a vontade de Deus, e isso falo por mim. São colocadas diante de nós várias situações cotidianas em que a Palavra de Deus nos vem claramente à mente, por manifestação do Espírito, revelando a vontade de Deus para cada situação específica, e ainda assim não manifestamos o desejo de realizá-la. Isso é possível? Sim, porque estamos sendo santificados na alma, na sede de nossa vontade. E a graça de Deus, o seu poder imenso transforma a nossa vontade segundo a vontade dEle, de maneira que o Seu propósito em nossa vida é levado a efeito nas circunstâncias mais triviais de nossa existência. Isso porque Deus disciplina àqueles que recebe como filhos.
CONCLUSÃO
            Vivemos tempos difíceis, em que os homens são arrogantes, presunçosos, amantes de si mesmos, mais amantes dos prazeres do que amantes de Deus. Qualquer doutrina que lhes imponham deveres inatingíveis e excluam o seu pretenso poder ou sua liberdade de escolha, o chamado "livre-arbítrio", é tida como heresia. Graças a Deus, a Sua soberania não muda, e a sã doutrina da graça nos revela que Deus é que é poderoso para realizar muito além daquilo que pedimos ou pensamos, segundo o Seu grande poder que em nós opera.
            Se devemos, mas não podemos nem queremos, peçamos a Deus que opere em nós o Seu querer e o Seu poder. Como disse M. ECKHART, "a alma deve ansiar por Deus a fim de se inflamar com o amor dele; mas, se ela ainda não puder sentir esse anseio, então deve ansiar pelo anseio. O anseio pelo anseio também vem de Deus".
            Os que já foram alcançados por esse amor não podem se esquecer de que "nós o amamos porque Ele nos amou primeiro" (I João 4:19). Sem Cristo nada podemos fazer. Em Cristo, podemos todas as coisas, porque Ele nos fortalece.
            Por fim, quero trazer uma meditação colhida do final do artigo último citado:
            "Por meio de uma simples manifestação de poder, Deus pode trazer de volta ao seu curso uma estrela perdida e permanecer inalterado diante da interferência das leis da natureza. Mas, como afirmam eles, estender Deus a sua mão e resgatar a vontade humana de seu caminho errado, para trazê-la de volta ao caminho de santidade, é um exercício injustificável de seu poder e uma usurpação da liberdade do homem! Que mundo! Neste mundo o homem segue todo o seu próprio caminho, e Deus não tem a permissão de interferir, exceto naquilo que o homem chama de legítimo! Que mundo! Neste mundo tudo se volta à vontade do homem, todos os acontecimentos do mundo ou na igreja são regulados, moldados, impulsionados somente pela vontade do homem. A vontade de Deus é algo secundário; seu papel é apenas contemplar os acontecimentos e seguir os passos da vontade humana. Neste mundo o homem deseja, e Deus tem de dizer: Amém!
            Em toda esta absoluta oposição à vontade de Deus, vemos a vontade própria dos últimos dias manifestando-se a si mesma. No princípio, o homem quis ser um deus e continua a lutar por isso nos últimos dias. Ele está decidido a fazer que sua vontade tome a precedência que pertence à vontade de Deus. No último anticristo esta vontade própria será sumariada e revelada. Ele é o rei que fará "de acordo com sua vontade". E na atual controvérsia do "livre-arbítrio", vemos demonstrado esse mesmo espírito. O anticristo está nos falando, exortando-nos à independência orgulhosa. A vontade própria é a essência da religião anticristã. É a raiz de amargura que hoje brota em muitas igrejas. Ela não procede do alto e sim de baixo; é terrena, animal e diabólica".
            Que o Deus de misericórdia, o Pai das luzes, o Deus de toda a graça, nos livre de querermos viver de acordo com a nossa própria vontade. Antes, que Ele nos conceda a graça de realizarmos a Sua vontade no tempo que nos resta de existência. Ele é fiel, e fará isso! Desenvolvamos, pois, nossa salvação...

segunda-feira, 18 de julho de 2011

DEVER, PODER E QUERER - Parte 11


            GILDÁSIO REIS foi feliz ao pontuar: "Diz-se que a vontade do homem é livre para decidir entre o bem e o mal. Mas é livre do quê? É livre para escolher o quê? A vontade do homem é a sua capacidade de escolher entre alternativas. A sua vontade de fato decide qual a sua ação entre um certo número de opções. Nenhum homem é compelido a agir contrário à sua vontade, nem forçado a dizer aquilo que não quer. Suas decisões não são formadas por uma força externa, mas por forças internas. A vontade toma decisões, e estas decisões tomadas não estão livres de influências. O homem escolhe com base nos sentimentos, gostos, entendimentos, anseios, etc. Em outras palavras, a vontade não é livre do homem mesmo. Suas escolhas são feitas pelo seu próprio caráter. Sua vontade não é independente de sua natureza".
            Aqui é que bate o ponto. O homem natural, morto em delitos e pecados, só é livre para fazer o que o seu coração mal dita. Seus sentimentos distorcidos, seu conhecimento do bem e do mal segundo seu código axiomático contaminado pelo pecado o compele a optar segundo sua vontade egoísta. É uma questão de natureza e, conseqüentemente, de tropismo. Enquanto a raiz busca o solo (geotropismo), a folha busca a luz (fototropismo). Enquanto o homem natural busca seus próprios interesses e a satisfação da carne, o homem espiritual busca os interesses do Alto e a atuação do Espírito. Como disse Paulo, "quem vive segundo a carne tem a mente voltada para o que a carne deseja; mas quem vive de acordo com o Espírito, tem a mente voltada para o que o Espírito deseja. A mentalidade da carne é morte, mas a mentalidade do Espírito é vida e paz; a mentalidade da carne é inimiga de Deus, porque não se submete à lei de Deus, nem pode fazê-lo" (Romanos 8: 5 a 7).
            Daí se vê claramente que ao homem natural, que é dominado pela carne, é impossível se submeter à lei de Deus e ao Espírito Santo. É por essa razão que ele precisa ser vivificado antes de qualquer coisa. Antes de crer, o homem precisa ter vida, pois ele está morto espiritualmente. Se nessa condição ele não consegue entender as coisas do Espírito de Deus, como poderia crê-las ou mesmo desejá-las? A vontade, portanto, é escrava de seu senhor, e o senhorio sobre homem natural é exercido pelo pecado, um estado de incredulidade e suposta independência em relação a Deus que por conta própria qualquer descendente de Adão não quer e nem pode admitir.
            Mas o texto base nos fala da operação da vontade divina, que é boa. Segundo a boa vontade de Deus, Ele opera em nós tanto o querer quanto o realizar. Assim, quando o incrédulo começa a sentir o desejo de crer, já é manifestação da graça e do poder de Deus. Lembro-me do testemunho de minha amada mãe, a respeito de uma certa sobrinha sua que lhe externou a vontade de crer no Evangelho que ela cria, ao que respondeu: "Essa vontade já é manifestação da graça de Deus". De fato, com ela, comigo, e com qualquer outra pessoa que tenha passado "da morte para a vida" há a lembrança de quando Deus começou a obra de convencimento do pecado e de desejo de ser liberto da velha natureza adâmica. Não fosse a graça divina, nosso querer jamais teria sido movido em direção à cruz, isto é, à morte da velha natureza.
            Portanto, o querer ser salvo também é divino, de sorte que nem a vontade exercemos no sentido da salvação. Quando queremos ser salvos de nós mesmos podemos ter a certeza de que é a graça divina operando.
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sexta-feira, 15 de julho de 2011

DEVER, PODER E QUERER - Parte 10

            MARTINHO LUTERO declarou: "a prova máxima do pecador é ele não conhecer o seu próprio pecado". Em sua clássica obra "A Escravidão da Vontade", o mártir da reforma protestante explica com muita propriedade que o "livre-arbítrio" foi perdido com a queda, de maneira que a liberdade de um escravo do pecado é uma contradição de termos, e só pode ser exercida no sentido do próprio pecado. Existe uma lei operando em seus membros: a lei do pecado. Assim como a lei da gravidade opera no universo atraindo todos os corpos ao centro da terra, a lei do pecado atrai para baixo aqueles que estão sob seu domínio.
            É preciso, portanto, uma nova lei que liberte o homem dessa escravidão: é a lei do Espírito de vida, que vigora através da graça divina revelada em Cristo.
            Ao refutar as idéias de Erasmo de Roterdã a respeito do "livre-arbítrio" escreveu LUTERO: "Você assevera que o "livre-arbítrio" é a capacidade que a vontade humana tem, por si mesma, de decidir se aceita ou não a palavra e as obras de Deus. Isso equivale a fazer com que a vontade humana seja capaz de escolher entre o céu ou o inferno. Isso significa que não há espaço para a atuação do Espírito Santo ou para a graça divina. Isso põe a vontade humana no mesmo nível de Deus. Os pelagianos também fizeram isso. Mas você os ultrapassa! Eles distinguiam em duas parte o "livre-arbítrio" - o poder de compreender a diferença entre as coisas e o poder de escolher entre elas. Porém, para você o "livre-arbítrio" tem o poder de escolher coisas eternas, embora seja totalmente incapaz de entendê-las. Desse modo, você criou um "meio livre-arbítrio". Além disso, você contradiz a si mesmo, porquanto uma vez afirmou que "a vontade humana nada pode fazer sem a graça divina". No entanto, quando você chegou a escrever uma definição do "livre-arbítrio", concedeu total liberdade para a vontade humana. Você é um homem muito estranho! Prefiro até mesmo o ensinamento de alguns filósofos aos seus. Eles diziam que um homem entregue a si mesmo só faria o que é errado. O homem só poderia escolher o bem com a ajuda da graça divina. Eles diziam que os homens são livres para decair, mas que precisam de ajuda para elevarem-se! Porém, é motivo de riso chamar a isso de "livre-arbítrio". Com base em tais conceitos, eu poderia afirmar que uma pedra tem "livre-arbítrio", pois só pode cair, a menos que seja erguida por alguém! O ensino daqueles filósofos, porém, ainda é melhor do que o seu. A sua pedra, Erasmo, pode escolher se sobe ou desce!" (in "Nascido Escravo", Ed. Fiel, 1a. edição, 1992, p. 40/41).
            O ensinamento de Lutero tem respaldo na Palavra de Deus e vem corroborar o que queremos demonstrar quanto à vontade humana. Se a liberdade do homem é direcionada no sentido da queda, isto é, do pecado, não se trata de liberdade. A questão não envolve apenas atitudes, mas a natureza do homem. Este, ainda que faça o bem, não pode alcançar a Deus ou a salvação que vem dEle mediante suas obras. Todavia, o problema é ainda mais grave. O homem natural não apenas não pode buscar a Deus, mas também não quer fazê-lo. Sua vontade é escrava de sua natureza pecaminosa. O Salmista descreve bem essa situação: "O Senhor olha dos céus para os filhos dos homens, para ver se há alguém que tenha entendimento, alguém que busque a Deus. Todos se desviaram, igualmente se corromperam; não há ninguém que faça o bem, não há nem um sequer" (Salmos 14: 2 e 3). No Capítulo 53, versos 2 e 3 do mesmo livro vemos essa verdade repetida, a qual foi transcrita por Paulo em Romanos 3: 9 a 20.
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quinta-feira, 14 de julho de 2011

DEVER, PODER E QUERER - Parte 9

QUERER

            Diz-se que o homem antes da queda detinha a liberdade da vontade, o que se convencionou chamar de "livre-arbítrio". Tal liberdade o homem a tinha em si mesmo, estando portando sujeito a perdê-la, o que efetivamente foi feito após a escolha errada em face da errônea interpretação quanto ao "não comerás". A liberdade de escolha, ou o livre exercício da vontade, era por assim dizer mutável, por isso Adão a perdeu quando pecou.
            A Confissão de Fé de Westminster, em seu Capítulo IX, seção 2, declara: "O homem, em seu estado de inocência, tinha a liberdade e o poder de querer e fazer aquilo que é bom e agradável a Deus, mas mutavelmente, de sorte que pudesse decair dessa liberdade e poder". Concordamos em parte com a doutrina esposada. A liberdade humana antes da queda era limitada, porque a liberdade verdadeira e plena só pode ser conquistada em Cristo. Ademais, o homem só pode ser agradável a Deus "no Amado". Como dissemos no primeiro estudo da série, o dever-ser é, sempre foi e sempre será Cristo. A queda, uma revelação de que a liberdade sem Cristo é um mito. Depois da queda, a "liberdade" se tornou escravidão, pelo que o "posse non peccare" agora se transformou em "non posse non peccare", o que exclui qualquer possibilidade de o homem cooperar na questão de sua salvação.
            DEVERN F. FROMKE, a propósito, comenta: "Quando Adão primeiramente apareceu no maravilhoso Jardim do Éden, ele foi colocado naquele nível intermediário: em liberdade. A escolha que ele tinha diante de si era ou tornar-se um escravo de amor para Deus, ou tornar-se um escravo debaixo da lei. Desde o momento em que Adão escolheu seu próprio caminho egoísta, toda a raça humana tem necessitado de uma lei exterior para refrear suas inclinações egoístas. Seria maravilhoso se pudéssemos começar, como Adão, naquele nível intermediário de liberdade. Mas todos, por causa de suas inclinações interiores para o egoísmo e rebelião contra Deus, necessitam de um Salvador para tirá-los da escravidão e do pecado" ("Supremo Propósito", p. 141).
            Além de não ser possível ao homem salvar-se, ou cooperar na salvação (por incapacidade e ausência de permissão divina), também não faz parte de sua constituição o querer ser salvo. Com efeito, defrontando-se com a idéia dicotômica de céu e inferno, é lógico e razoável que queira o céu. Ninguém quer ficar "queimando no inferno", como bem disse C. D. COLE. Todavia, quando se trata de aceitar a salvação em sua inteireza, envolvendo aí a libertação do "eu" e do pecado, o ser humano, por conta própria, não se manifesta favorável. Como pode alguém negar a si mesmo? Como pode querer ser liberto de si mesmo? É essa a proposta do Evangelho: Morte para o "eu" e vida para Deus em Cristo. Isso o homem natural não quer, até porque não entende o Evangelho por si só. O homem natural não aceita as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura, e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente, como nos ensina Paulo em I Coríntios 1: 9 a 16. O Evangelho permanece encoberto para aqueles que estão se perdendo. Para que sejam salvos, é mister uma intervenção divina, através do Seu Espírito, para convencer o homem de seu estado pecaminoso, de cegueira e morte espiritual.
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quarta-feira, 13 de julho de 2011

DEVER, PODER E QUERER - Parte 8



            O poder para realizar algo, isto é, a capacidade ou a permissão, ou ambos os fatores conjugados, não tem o condão, por si só, de tornar esse algo suscetível de realização. É mister que esteja presente o elemento volitivo. Quem nunca ouviu a frase "faltou vontade política?". Sem vontade, política ou não, o homem não se dispõe a prosseguir em seus ideais, sonhos ou projetos, pessoais ou coletivos. Sob o prisma inverso, é muito popular a idéia do "querer é poder". Há muitas pessoas que seguem esse lema de vida: se eu quero, eu posso. Se o poder não prescinde do querer, este de forma ousada propõe-se a mover as circunstâncias internas e externas em prol dos objetivos da vontade.
            Essa idealização do querer muito se assemelha à filosofia do "Príncipe" de Maquiavel, segundo a qual "o fim justifica os meios". Em outros termos, se eu quero, nada poderá me impedir de concretizar meus ideais. Nossa vontade é um fator importante de expressão da personalidade, e por isso mesmo um fator delicado e perigoso. Alguém já disse: "Tome cuidado com aquilo que deseja; você pode conquistá-lo". A lição aí é a de que nem sempre desejamos coisas adequadas e benéficas.
            No que concerne à salvação do espírito, da alma e do corpo, pois é esse o enfoque dessa série de meditações, o homem natural não exerce a vontade da maneira que convém, nem poderia fazê-lo, pois a nossa vontade é escrava do pecado desde que nascemos. É dito que o homem dispõe de liberdade de escolha, o chamado "livre-arbítrio" e, portanto, pode e deve manifestar seu desejo na direção da sua salvação. É nesse sentido que se repetem dominicalmente os apelos nos púlpitos de muitas igrejas ditas cristãs. Cumpre alertar, entretanto, que a idéia faz muito bem ao ego, mas está totalmente divorciada da verdade, pois ao arrepio da Palavra de Deus.
            É certo que o homem dispõe de liberdade para realizar muitas coisas. Contudo, não é livre para deixar de pecar. Se o fosse, para que o sacrifício do Cordeiro que tira o pecado do mundo e que nos liberta paulatinamente do poder do pecado? SANTO AGOSTINHO distinguiu muito bem a situação do homem, antes e depois de ser salvo:

ANTES DO PECADO
Posse non peccare
DEPOIS QUE PECOU
Non posse non peccare
DEPOIS DA REGENERAÇÃO, COM O CORPO TERRENO
Posse non peccare
DEPOIS DA REGENERAÇÃO, COM O CORPO CELESTIAL
Non posse peccare

            No quadro acima identificamos o homem natural na 2a. realidade, em que o pecar é uma possibilidade natural, e o não pecar uma impossibilidade.
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terça-feira, 12 de julho de 2011

DEVER, PODER E QUERER - Parte 7

            Nesse aspecto da salvação, portanto, cabe a Deus-Pai o cuidado com os filhos que adotou em Cristo, e esse cuidado é eterno, e se realiza pela santidade da vida do Filho. Nele reside a plenitude da divindade, e nEle somos desenvolvidos por graça, segundo a iniciativa, a vontade e o propósito divinos. Em Hebreus 10:14 lemos que o sacrifício de Cristo aperfeiçoou de uma vez por todas aqueles que estão sendo santificados. Logo, o que Deus desejava realizar por meio de Cristo em minha vida Ele já realizou, de acordo com o Seu propósito eterno, e por meio dos eternos efeitos do sacrifício do Cordeiro. A manifestação disso no tempo é que nos confunde, mas para Deus não há passado, nem presente, nem futuro, e o que Ele queria realizar por intermédio do Filho está realizado.
            Se é verdade que não participamos do processo de redenção, também não participamos da santificação. Dela somos meros recipientes, não agentes. Como crianças recém-nascidas dependemos totalmente de Deus e, portanto, necessitamos do “puro leite espiritual”. Não somos capazes de nos tornar mais santos do que somos, nem nos é permitido fazê-lo. O Espírito Santo é que produz a vida do Santo em nós, e nos desenvolve ao longo de nossa existência terrena até aquele ponto em que Deus já determinou. Lembremo-nos de que todos os nossos dias já estavam contados antes mesmo de virmos à existência (Salmos 139:16).
            Em uma terceira fase, temos a salvação da presença do pecado, a saber, a glorificação do corpo. Talvez nessa fase seja mais perceptível a soberania e o poder de Deus. Isso porque nenhum salvo sabe quando vai morrer, e quando morrer estará sujeito a uma realidade preparada por Deus, tendo a promessa futura de novos céus e nova terra, em que o pecado não se manifestará, pois o que é corruptível (carne e corpo) se revestirá de incorruptibilidade. Corpos terrenos serão transformados em corpos espirituais, conforme nos ensina Paulo em I Coríntios 15: 45 a 57. Em Filipenses 3:21, referindo-se ao nosso Salvador e Senhor, Paulo escreve: “Pelo poder que o capacita a colocar todas as coisas debaixo do seu domínio, ele transformará os nossos corpos humilhados, tornando-os semelhantes ao seu corpo glorioso”.
            A regeneração do espírito, a santificação da alma e a glorificação do corpo são, portanto, fases do viver do salvo em que a manifestação da graça e do poder de Deus se fazem presentes, nada havendo em nós que possa contribuir de alguma maneira para o sucesso da empreitada. Deus age soberanamente e graciosamente em nós, de maneira que possamos começar a entender, e louvar, a Sua glória, o Seu poder e a Sua graça. O Salmista bem percebeu essa atuação completa ao declarar: “É ele que perdoa todos os seus pecados e cura todas as suas doenças, que resgata a sua vida da sepultura e o coroa de bondade e compaixão” (Salmos 103: 3 e 4). Espírito, alma e corpo são recipientes da ação divina, e por causa da Sua fidelidade Ele nos apresentará perante Ele mesmo santos e irrepreensíveis: “Que o próprio Deus da paz os santifique inteiramente. Que todo o espírito, a alma e o corpo de vocês sejam preservados irrepreensíveis na vinda de nosso Senhor Jesus Cristo. Aquele que os chama é fiel, e fará isso” (I Tessalonicenses 5: 23 e 24).
            Deus se apresenta em Sua Palavra como o “Todo-Poderoso”. Nele, de fato, está todo o poder. O que é impossível para o homem é perfeitamente possível para Deus. Por isso, o maior exemplo de cristão concluiu que nEle, isto é, naquele que o fortalecia, era possível ao apóstolo suportar ou estar contente em qualquer situação. Judas, por sua vez em sua doxologia, revela em quem está o poder: “Àquele que é poderoso para impedi-los de cair e para apresentá-los diante da sua glória sem mácula e com grande alegria, ao único Deus, nosso Salvador, sejam glória, majestade, poder e autoridade, mediante Jesus Cristo, nosso Senhor, antes de todos os tempos, agora e para todo o sempre! Amém” (Judas 24).
            Destarte, em todas as esferas da salvação, inclusive aquela que somos instados a desenvolver (ou, a por em ação), vemos que a ação é, na realidade, divina, segundo a operação da graça e do poder de Deus. Quando reconhecemos que nada podemos em nós mesmos, mas que Deus tudo pode, começamos a experimentar a atuação do Seu poder. Como bem disse JOHN OWEN, “Não teremos nenhum poder de Deus, a não ser que sejamos convencidos de que não temos nenhum poder em nós mesmos”. Graças a Deus, esse convencimento é obra dEle, que opera na fraqueza. Temos um tesouro em vasos de barro, isto é, a vida de Cristo em corpos corruptíveis, para que entendamos que a excelência do poder é de Deus, e não nossa (II Coríntios 4:7). A nossa força, que não é nossa, está na nossa fraqueza.
            Glórias sejam dadas ao Deus eterno por Sua maravilhosa graça revelada no Evangelho, que opera em nós uma salvação completa, de acordo com Seu grande poder, segundo o beneplácito da Sua vontade.
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segunda-feira, 11 de julho de 2011

DEVER, PODER E QUERER - Parte 6

            O Deus da Palavra não age assim. Isso Ele nos revela nas seguintes declarações: “O Senhor é muito paciente, mas o seu poder é imenso; o Senhor não deixará impune o culpado” (Naum 1:3-a); “Absolver o ímpio e condenar o justo são coisas que o Senhor odeia” (Provérbios 17:15); “O Senhor é muito paciente e grande em fidelidade, e perdoa a iniqüidade e a rebelião, se bem que não deixa o pecado sem punição” (Números 14:18-a). Logo, se Cristo tivesse morrido pelo pecador, e este permanecesse ileso, Deus seria injusto e mentiroso. Todavia, a Palavra revela a justiça de Deus por meio do Evangelho (Romanos 1:17), e este declara que Cristo morreu na cruz, mas o pecador morreu juntamente com Ele (João 12: 32 e 33). A condição de morto para o pecado e vivo para Deus (Romanos 6: 10 e 11) é transmitida em Cristo a todo aquele que foi regenerado, isto é, que foi gerado novamente, desta feita não mais do cruzamento de espermatozóide e óvulo humanos, mas da ação conjunta da Palavra de Deus e do Espírito Santo (João 3: 1 a 21).
            O único que poderia passar pela morte de cruz sem ser retido por ela transmite a todo o que crê a Sua vida. Ninguém pode morrer por conta própria, nem muito menos viver uma vida ressurreta. Ademais, se não nascemos na carne segundo a nossa vontade, mas segundo a vontade de nossos pais, na vida espiritual tal realidade se verifica, de sorte que somos feitos filhos de Deus segundo a vontade dAquele que nos gerou (João 1:10 a 13).
            Na segunda etapa da salvação não há mais condenação. A sentença de morte já não pesa sobre nós, uma vez que já foi cumprida no corpo de Cristo. Por essa morte da qual nos tornamos participantes somos justificados, mediante a fé. Agora, o que nos é exigido é CRUZ DIÁRIA, NEGAÇÃO DO “EU”, SUBMISSÃO DA VONTADE e OBEDIÊNCIA. Não é preciso digressões para concluir que todas essas exigências da vida cristã são impraticáveis do ponto de vista humano.
            Na salvação do poder do pecado, que se dá no âmbito da alma, temos o desenvolvimento da vida de uma pessoa em nós, por isso a chamamos de vida cristã: é a vida de Cristo. Na vida do “eu” podemos dizer que nos desenvolvemos pelo cuidado inicial de nossos pais e tutores e, posteriormente, pelo nosso próprio cuidado com nossa subsistência e desenvolvimento físico, mental e sentimental. Agora, no homem espiritual, tais aspectos continuam precisando de cuidados, mas eles não constituem a essência do ser. O viver do homem espiritual é Cristo, e o morrer já não é prejuízo, pois ele vive no plano do eterno, não do efêmero. O homem natural deposita suas forças, riquezas e esperanças em coisas e pessoas deste mundo. Sua vida está confinada no tempo e no espaço à realidade visível e material. Já o homem espiritual tem uma viva esperança, isto é, uma esperança que não se apaga com as circunstâncias, nem com o advento da morte física. Essa esperança é Cristo. Ela é viva e eterna porque Cristo é a própria vida eterna. 
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